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    Aporofobia: mais uma palavra aprendida durante a pandemia
    Autor: ​​​​​​​Editorial SindSaúde-SP
    10/12/2021

    A cada novo dia que amanhece no Brasil, a pobreza dá mais um passo adiante. Principalmente nas ruas das grandes capitais, vemos famílias inteiras apinhadas em barracas, cidadãos desesperados pedindo um prato de comida, filas de desempregados em busca de uma chance.

     

    Nesta sexta-feira (10), é celebrado o Dia Internacional dos Direitos Humanos, cujo tema neste ano é a redução da desigualdade. A pandemia recrudesceu a desigualdade em todo mundo, como resultado do capitalismo selvagem que beneficia muito alguns poucos privilegiados, enquanto detona a vida de outros tantos. E, como normalmente acontece em momentos históricos assim, cresce também o preconceito, o qual já vinha se disseminando no país quando aqueles que não tinham lugar e voz passaram a tê-los, ocupando espaços sociais que não conseguiam alcançar, como os bancos das universidades brasileiras e o mercado de consumo.

     

    Desde que esse movimento teve início, a luta de classes, até então camuflada, voltou à superfície, incitando preconceitos. Foi então que aprendemos uma nova palavra, aporofobia, a qual, conforme o dicionário da Academia Brasileira de Letras (ABL), significa “repúdio, aversão ou desprezo pelos pobres ou desfavorecidos; hostilidade para com pessoas em situação de pobreza ou miséria”.

     

    O que não queremos ver

     

    Embora seja inaceitável qualquer forma de preconceito, é compreensível, a depender do contexto, que ninguém goste de ver a pobreza, tão bem retratada no clássico da literatura brasileira “Quarto de Despejo”, de Carolina Maria de Jesus, uma mulher preta, pobre e mãe solo, que vivia na favela do Canindé, na zona norte de São Paulo, na década de 1950.

     

    O diário escrito por Carolina Maria de Jesus, que está sendo revisitado para ser relançado, é o retrato mais cruel e real do que é viver no Brasil e, principalmente, em uma grande metrópole brasileira. De lá até hoje, pouco ou quase nada mudou, pelo contrário.

     

    A economia brasileira naufraga e o custo de vida tem sido tão alto que as ossadas de boi e frango vivaram iguarias para os famintos durante a pandemia. A inflação está galopante, assombrando as perspectivas de um futuro mais promissor.

     

    A pesquisa Desigualdade de Impactos Trabalhistas na Pandemia, coordenada pelo diretor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Marcelo Neri, e divulgada em setembro passado, mostra que a pressão econômica foi maior nos pobres, que perderam mais renda e emprego. Conforme o estudo, “os dados mostram um cenário desolador no início de 2021, quando, em seis meses, o número de pobres foi multiplicado por 3,5 vezes, correspondendo a 25 milhões de novos pobres em relação aos seis meses anteriores”.

     

    Ainda segundo um estudo, houve um respiro na vida dos pobres com o auxílio emergencial pago pelo governo, mas o efeito durou pouco tempo.

     

    Os pobres se multiplicam nas ruas do país, em uma demonstração de que até mesmo a pobreza - situação esta que ninguém quer viver, por ser altamente desumano - tem as suas diferenças. Afinal, até mesmo entre os pobres há aqueles mais e outros menos, apesar de a pobreza, independentemente de suas camadas, a ruim de todos os jeitos.

     

    Ao futuro

     

    O surgimento da variante ômicron jogou um balde de água fria nas intenções de fim de ano. Com a vacinação mais avançada, havia o sonho de um Natal e Ano-Novo mais relaxado e próspero ao lado dos entes que amamos. Mas a nova cepa nos colocou em estado de alerta novamente.

     

    No Brasil, em particular, vivemos tempos estranhos. Fala-se mais nas eleições de 2022 como se não estivéssemos vivendo uma grave crise econômica, com milhares de miseráveis ao relento, ou uma emergência climática das mais graves, ou ainda, uma crise sanitária sem data para acabar.

     

    Sendo assim, o que nos resta enquanto sociedade? Cabe àqueles que ainda têm um emprego para chamar de seu, não perderam nenhum ente para o vírus e ainda podem se dar ao luxo de pagar R$ 60, em média, no quilo da carne, a não fingirem que o que acontece nas ruas e no planalto central não está no escopo de seus problemas.

     

    A Organização das Nações Unidas (ONU) elegeu a redução das desigualdades como tema deste ano não à toa. Diminuir a desigualdade e quantidade de miseráveis é um problema, não só dos Estados que lhes viram as costas, mas, também, de toda a sociedade.

     

    Não adianta colocar grades, pedras e muros em espaços públicos ou privados para impedir a chegada desses cidadãos invisíveis socialmente. Precisamos, isso sim, construir mais pontes para que possamos, juntos, chegar a um estado de bem-estar social que beneficie a todos e não apenas alguns.