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    Ex-trabalhadora do SindSaúde-SP é eleita conselheira tutelar em Araraquara
    Autor: Redação SindSaúde-SP
    16/01/2024

    Crédito Imagem: SindSaúde-SP

    Criados em paralelo ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990, os Conselhos Tutelares têm o papel de zelar pelas crianças e adolescentes e garantir que seus direitos sejam aplicados sem discriminação de nascimento, situação econômica, idade, gênero, raça ou crença. 

    Mas, na prática, esses espaços há tempos tornaram-se um campo de disputa ocupado majoritariamente por representantes de religiões protestantes que enxergam neles ambientes para emplacar pautas conservadoras. 

    Em Araraquara, município há quase 280 km da capital paulista, uma ex-trabalhadora do SindSaúde-SP conseguiu furar a bolha e se eleger conselheira tutelar. 

    Gabrielle de Oliveira, 29, formada em pedagogia pela Universidade de São Paulo (USP), assumiu no último dia 10 um mandato com duração de quatro anos. Entre 2018 e 2019, ela atuou no sindicato como agente de filiação e trabalhava na prefeitura como gestora do Centro de Juventude da cidade onde mora. 

    Ela conta que a opção por concorrer partiu do diagnóstico de quem conheceu de perto a situação das famílias pobres araraquarenses. 

    “Eu atuei no programa Filhos do Sol, que atende crianças e adolescentes em altíssima vulnerabilidade, e percebi que era preciso ir além para não ficarmos ‘enxugando gelo’. Porque tínhamos de fazer contato com muitos conselheiros tutelares e percebíamos que nem todos estavam comprometidos com seus papeis, mas sim a questão religiosa”, explica. 

    Segundo ela, a candidatura foi um contraponto laico para mudar um cenário em que o principal instrumento para nortear a atuação dos conselheiros não é respeitado. De acordo com o ECA, ações como a condução de menores a abrigos deve ser uma exceção e não uma regra. Para isso é necessária empatia, define, e dialogar com as famílias, sem considerar que questões como pobreza e baixa escolaridade são fatores impeditivos para a manutenção das famílias. 

    Trabalho integrado
    Gabrielle diz que à frente do programa Filhos do Sol muitas vezes constatou a falta acesso à informação como o principal problema, dificuldade que impedia famílias em situação de extrema pobreza estarem inscritas no Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) da cidade, uma alternativa para distribuição de renda. Ou pais adictos que poderiam ser atendidos pelo Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), mas desconheciam essa opção. 

    O papel do conselheiro é atuar para oferecer alternativas que busquem manter o núcleo familiar, porém, interesses econômicos passavam à frente do trabalho. Algo que ficou claro na campanha. Enquanto a divulgação do nome dela era feito por amigos e parceiros, candidatos de igrejas evangélicas contaram com pessoas levadas para votar em ônibus alugados. 

    A predominância religiosa, explica, afeta diretamente o futuro de muitas crianças e adolescentes, que são julgados com base em valores consevadores e não definidos no ECA.  

    “Fiz 80 horas de transição com conselheiros que saiam para verificar denúncias de maus tratos e a visão que vi foi assustadora. De gente que considera uma mãe ruim porque é tatuada, ou que apanha do marido porque quer, dizendo que quem tem três filhos autistas é porque possui algum problema. Fiquei chocada com a pouca sensibilidade e com a dificuldade em entender o contexto violento em que estão inseridas essas pessoas”, diz.

    Impacto do conselho
    Em 2020, dois casos de grande repercussão mostraram o impacto que o conselho tutelar pode trazer para a sociedade. Em São Mateus, no Espírito Santo, uma menina de 10 anos engravidou após ser estuprada pelo companheiro de uma tia e a então ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, enviou emissários para o local na tentativa de demover a família da vítima de realizar a interrupção da gestação, autorizada pela Justiça.

    Damares teria contado com informações confidenciais prestada por dois conselheiros tutelares conservadores ligados a igrejas neopentecostais, situação investida pelo Ministério Público. 

    No mesmo ano, uma mãe perdeu a guarda da filha de 12 anos a mando do conselho tutelar de Araçatuba, no interior de São Paulo, depois que a menina teve a cabeça raspada de forma consensual em um ritual de iniciação do Candomblé. A denúncia partiu da avó da menina, que é evangélica, sob alegação de maus-tratos e abuso sexual.

    Gabrielle destaca que se a sua vitória representa um avanço, o trabalho laico tende a encontrar dificuldades, já que dos 10 integrantes do conselho onde atuará, apenas dois não são conservadores, pastores ou familiares de líderes religiosos evangélicos. 

    “Precisamos ter maior compromisso com esse espaço, que não serve para encaminhar crianças para instituições como abrigos financiadas por igrejas que lucram com isso e nem deve ser trampolim para quem quer ser candidato a um cargo legislativo”, critica. 

    Secretário de Políticas e Gestão em Seguridade Social, Ricardo de Oliveira, aponta a importância de os conselhos terem nomes que entendam a importância do compromisso social acima de valores religiosos. 

    “Nos últimos anos, o SindSaúde-SP tem ocupado, sob diversas formas, espaços de decisão na sociedade e esse é mais um. Ter alguém que vivenciou a rotina do sindicato, visitou as unidades de saúde, conversou com trabalhadores e que certamente trará um olhar diferenciado e qualificado ao conselho é fundamental. Alguém que demonstrará a importância de ter uma visão de que o problema social tem relação com uma sociedade desigual, racista e machista, além de outras questões”, avalia. 










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