Ministro da Saúde sinaliza para novo ataque contra SUS: governo agora também quer o fim da gratuidade
Autor: Assessoria de Imprensa - SindSaúde-SP
10/06/2019
Em entrevista, Mandetta dá um show de sectarismo na defesa das medidas de desmonte da saúde pública; greve geral de 14 de junho é momento privilegiado para dizer um basta a este governo da morte
Há uma meia verdade na opinião de que o governo de extrema-direita de Jair Bolsonaro está imobilizado e nada faz. Se olharmos para propostas voltadas aos desenvolvimentos social e econômico esta afirmação é de uma veracidade absoluta. Mas se o foco for os desmontes do Estado, dos direitos sociais e trabalhistas e da soberania nacional, além de fake news, este governo é veloz e produz barbaridades cotidianas em grande quantidade. Em entrevista divulgada em 27 de maio no Programa Roda Viva, da TV Cultura, com o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, foi possível recuperar algumas delas que vitimam a saúde pública. Em sua fala, Mandetta se vangloria de atacar o SUS – Sistema Único de Saúde com a proposta inimaginável de pôr fim à gratuidade no sistema.
A insensatez deste governo não tem limites quando se trata de atacar direitos e o Estado de Bem-Estar Social. É de conhecimento de todos, o inegável movimento feito por esta gestão para enfraquecer o SUS e, assim, favorecer as empresas nacionais e transnacionais de saúde. Ao avaliar os principais tópicos abordados na entrevista feita com Mandetta fica nítida a distopia que este governo representa. Nenhum Chefe do Executivo Federal desde 1988, quando a Constituição Federal estabeleceu as diretrizes do SUS, propôs uma aberração como esta de pôr fim à gratuidade.
Fim da gratuidade no SUS
O ministro foi incisivo em dizer que vai, sim, “provocar” o Congresso a defender o fim da gratuidade universal, uma das premissas basilares do SUS. Entre as mesquinhas e desqualificadas justificativas está, segundo ele, o de que “não é justo ou equânime uma pessoa que recebe 100 salários mínimos ter o atendimento 100% gratuito no SUS”. É novidade ver alguém deste governo preocupar-se com justiça, mas vamos aos fatos. Esta afirmação de Mandetta é um tanto frágil por desconsiderar que o percentual da população que ainda se sustenta nesta camada social não faz uso do sistema, quando muito usufrui das ações de vigilância e preventivas, por ter acesso a planos privados.
A miopia proposital do governo esconde os indicadores sociais que já apontam que os trabalhadores expulsos da classe média estão migrando massivamente para o SUS. Ou seja, a própria política excludente do governo está ampliando a demanda para uso do Sistema. Outro fato perigoso da proposta do governo é a própria subjetividade de definição de critérios socioeconômicos para dizer quem terá direito ou não a gratuidade nos serviços prestados no SUS. Atualmente cerca de 70% da população depende exclusivamente destes serviços públicos. É preciso lembrar que muitos tratamentos de alta complexidade só são oferecidos pela rede estatal.
A proposta de Mandetta é sectária e pensada de forma unilateral pelo governo. A CNTSS/CUT – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social sempre defendeu os direitos dos usuários e dos trabalhadores e as diretrizes estabelecidas no SUS, quais sejam: universalidade com equidade de acesso; integralidade na assistência; gratuidade; descentralização; participativo; e com financiamento. A Confederação não aceita a proposta do governo e entende que esta medida só beneficiaria o setor privado de saúde e excluirá definitivamente o segmento mais vulnerável economicamente do direito à saúde. É preciso, ao contrário do proposto pelo governo, garantir mais investimentos para a saúde pública visando melhorias nas condições e relações de trabalho e nos serviços prestados à população.
Ataque à política de combate à AIDS
Outro assunto impactante da entrevista foi a pergunta sobre as mudanças no Departamento Nacional de HIV/Aids. Isto tem a ver com a publicação do Decreto nº 9.795, de 17/05/2019, que modifica a estrutura do Ministério da Saúde ao transformar o “Departamento de IST, Aids e Hepatites Virais” em “Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis”. A justificativa foi que “a iniciativa visa o ataque comum ao HIV, à tuberculose e à hanseníase como doenças crônicas transmissíveis que possuem graus de preconceitos semelhantes e tratamentos longos e contínuos”. O ministro mencionou um aumento de verbas para a área, que foi desmentida posteriormente pela ABIA - Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids, por ter o valor menor do que o anunciado.
Na verdade, a medida significa um retrocesso perigoso que foi denunciado em Nota pela CNTSS/CUT por atingir diretamente o Programa Brasileiro de Combate ao HIV/Aids, que deixa de existir nos moldes que o consagrou como um dos melhores do mundo por seus resultados positivos. O programa condensa, entre as várias estratégias, ações de prevenção, tratamento e de garantia de acesso gratuito e universal a medicamentos e tratamento antirretroviral eficazes de combate à Aids. O Departamento ainda possuía dotação orçamentária própria e autonomia para aquisição de insumos, medicamentos e execução das políticas. Em um país onde o número de mortes ainda é elevado, mais de 12 mil ao ano, esta é, sem dúvida, mais uma medida criminosa desta gestão que já é chamada pela mídia de “governo da morte”.
Esvaziamento do Mais Médicos
O ministro teve que dar explicação sobre o desmonte do programa. A retirada dos médicos cubanos, feita por Bolsonaro nos primeiros dias de governo baseado em critérios ideológicos, foi lembrada. Mandetta mencionou, sem explicar, que o programa possuía problemas estruturais. Ao invés de esclarecer, justificou a medida do governo com o seguinte comentário: “Eu não vi nenhum cubano atendendo no Albert Einstein, na avenida Paulista, porque decerto se fizesse algo com alguém da elite paulista seria um absurdo, mas para o interior vale, como se houvesse vida do interior e da capital”.
Como foi amplamente divulgado pela imprensa, a criação do Programa procurou suprir a ausência de mão de obra em municípios e regiões onde os profissionais locais não apresentavam interesse. Tratavam-se, prioritariamente, de localidades longínquas e de população com grande vulnerabilidade econômica. A contratação dos médicos cubanos foi possível a partir de parceria com a OPAS - Organização Pan-Americana da Saúde, entidade da OMS – Organização Mundial da Saúde. Já nos primeiros meses os resultados foram bastante promissores, inclusive no âmbito da diminuição da mortalidade infantil.
Atualmente, cerca de 50% dos médicos brasileiros que assumiram as vagas deixadas em aberto desde o início do ano já se desligaram do Programa. O fato é que este governo não conseguiu seduzir os profissionais, como já era esperado, nem mesmo com a cantilena de apresentação de um Plano de Carreira. O enfraquecimento do Mais Médicos, conforme matéria do jornal Folha de S. Paulo de abril último, pode custar a morte precoce de mais de 100 mil pessoas em todo o país.
Greve geral: resposta dos trabalhadores
Mandetta ainda tergiversou sobre a política de combate às drogas. Mesmo com os avanços conquistados nos últimos anos, o governo federal vê a Política Nacional de Redução de Danos como questão ideológica. A insanidade é tamanha que eles entendem a luta antimanicomial como uma bandeira de esquerda, não como política universal pautada sobre direitos. O ministro também se esquivou quando perguntado sobre a questão do financiamento do SUS. Para entender a pouca importância que o ministro dá a este tema, basta lembrar que enquanto era deputado federal, votou favoravelmente a Emenda à Constituição (EC) nº 95, de congelamento de investimentos nas áreas sociais por 20 anos, entre elas a saúde.
Por conta desta emenda, o SUS perdeu, segundo indicadores divulgados na imprensa, somente neste ano cerca de R$ 9,5 bilhões de seu orçamento. Até 2036, período que vigora a EC, a estimativa é de perda de R$ 400 bilhões. Fato é que depois de quase três décadas de sua criação, o SUS é vitimado por ataques nunca antes realizados por qualquer governo nesta intensidade e voltados a sua desestruturação completa. É preciso lutar para derrubar a EC nº 95, recuperar o poder de investimento no SUS e neutralizar as medidas propostas por este governo que comprometem o sistema. Assim como é preciso resistir aos ataques de Bolsonaro contra todos os direitos dos trabalhadores.
A CNTSS/CUT – Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social tem denunciado e luta contra as medidas destes governos que chegaram ao poder após o golpe de 2016. Dia 14 de junho teremos a greve geral proposta pela CUT – Central Única dos Trabalhadores, demais Centrais Sindicais e pelo movimento social organizado. Vamos lutar para derrubar a proposta de Reforma da Previdência, assim como todas as demais medidas que são contrárias aos interesses da classe trabalhadora e estão construindo um abismo social nunca antes imaginado. É hora de dizer um “Basta!” aos desmandos deste governo de extrema-direita e ultraconservador de Bolsonaro e seus colaboradores.
Célia Regina Costa é secretária-geral do Sindicato dos Trabalhadores Públicos da Saúde do Estado de São Paulo (SindSaúde-SP) e tesoureira da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS/CUT)
Artigo publicado originalmente no site da CNTSS