Artigo
Imagine-se indo para uma guerra. Agora, imagine que houve um cessar-fogo, você é um soldado e está recuando, mas, quando está quase lá, é convocado a voltar novamente para o front.
A cena imaginária é real. O soldado (você) é um profissional de saúde lutando na pandemia de coronavírus. O descanso da tropa durou quase nada. Agora, com o repique da doença, que está mais forte do que no início da crise, você está na batalha de novo, porém, completamente exausto porque sequer pôde descansar.
A Covid-19 levou mais de 220 mil vidas no Brasil. Dessas, quase mil foram de profissionais de saúde, entre médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem, conforme dados levantados pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) e pelo Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), e divulgados pelo jornal “O Globo” esta semana. Ou seja, a conta desconsidera as demais trabalhadoras e trabalhadores da saúde, o que significa que o número é ainda maior.
Devemos levar em conta também a subnotificação de casos da doença no país, o que só reforça a tese de que mais gente morreu ou ficou doente, porque a testagem no Brasil é baixíssima.
SindSaúde-SP
Dados levantados pelo SindSaúde-SP dentro de sua base mostram que 59 trabalhadoras e trabalhadores da saúde pública do estado de São Paulo, tanto ativos quanto inativos, perderam suas vidas para a Covid-19.
É um triste balanço de se fazer, porque são vidas tentando salvar outras vidas e, no fim das contas, todas elas vítimas dos enormes erros de gestão e omissão do governo brasileiro na pandemia.
Pior do mundo
Tanto que, nesta semana, um instituto australiano considerou o Brasil o pior país do mundo na condução da crise sanitária. Foram analisadas 98 nações. Na liderança como melhor país está a Nova Zelândia, nação de 5 milhões de habitantes, que teve apenas 25 mortes e 2,3 mil casos da doença. No fim da fila, está o Brasil, com 220 mil vidas perdidas e 9 milhões de infectados.
Governada por uma mulher, a primeira-ministra Jacinta Ardern, de apenas 40 anos, a Nova Zelândia agiu rápido. Fechou as fronteiras, testou a população em massa, isolou os casos, ou seja, fez tudo o que se espera que um governante consciente e responsável faça. A condução foi tão bem-sucedida, que ela foi reeleita primeira-ministra do país em outubro passado.
O pior do mundo
A pandemia demorou um pouco mais para chegar aqui e o Brasil, que acompanhou o que vinha acontecendo na Europa, não fez a lição de casa.
O presidente Jair Bolsonaro preferiu ignorar a Ciência, chamou a pandemia de “gripezinha”, deu inumeráveis maus exemplos ao andar sem máscara e provocar aglomerações, propagandeou o uso de medicamentos comprovadamente ineficazes para a Covid-19 e, constantemente, desmerece as vacinas, que são resultado do árduo trabalho do funcionalismo público brasileiro.
O Brasil errou, errou feio, e quem paga o preço somos nós.
Trabalho intermitente
Em entrevista ao “O Globo”, Mário Scheffer, que é professor do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), lembrou que o fluxo de atendimento nos hospitais é permanente desde o início da pandemia.
“Mesmo nos períodos de estabilidade, nós mantivemos patamares elevados. Há um ano temos alta ocupação de enfermaria, leitos de UTI, triagem. Em momento algum os profissionais de saúde deixaram de estar expostos. Nunca deixaram de ter alto risco”, disse ao jornal.
Por essa razão, foram os prioritários na fila de vacinação e não poderia ser diferente.
É preciso lembrar que, ao mesmo tempo em que são heróis, os profissionais de saúde também são vítimas do descaso. Perdem eles, perdemos todos nós enquanto nação.