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Após ter promovido uma vacinação em massa contra a Covid-19 e colocado dinheiro no bolso dos norte-americanos para que consigam atravessar o período difícil da pandemia, o presidente Joe Biden, em ato histórico nesta semana, anunciou ser a favor da quebra de patentes para a fabricação de vacinas contra o coronavírus. Por outro lado, o governo brasileiro continua com sua postura beligerante de ser contrário à quebra.
Mas o que, na prática, isso significa? Precisamos voltar um pouquinho no tempo.
Em outubro do ano passado, Índia – que vem enfrentando uma situação gravíssima na pandemia – e África do Sul levaram uma proposta de suspensão das patentes de produtos - como máscaras - e fármacos/drogas em geral para o combate ao coronavírus à Organização Mundial do Comércio (OMC), órgão que regula a propriedade intelectual e industrial ao redor do planeta. Ou seja, a proposta dos dois países vai além do que defende Biden.
O propósito desses dois países seria facilitar a produção de vacinas por países pobres, além do acesso a equipamentos de proteção, garantindo o acesso dessas populações à prevenção e imunização.
Por sua vez, no Brasil, a falta de doses tem levado o país a uma situação dramática, uma vez que, quanto mais atrasa a imunização, novas cepas, mais resistentes, surgem.
Não faz muito tempo, o Brasil foi bem-sucedido quando decidiu quebrar patentes de medicamentos para tratar da aids, o que barateou e facilitou o acesso a medicamentos. Tanto que os indicadores de mortes pela doença caíram drasticamente como consequência da política.
Monopólio
Há mais de um ano, o mundo está lidando com a Covid-19 e, embora a vacina tenha sido colocada no mercado em tempo recorde, ainda são poucos os laboratórios que produzem o medicamento, o único capaz de reduzir os impactos da doença.
Atualmente, as principais vacinas contra a Covid-19 pertencem a laboratórios americanos, europeus e chineses, e grande parte delas foi financiada por governos e filantropos. Este é um dos argumentos que vem sendo usados para justificar a quebra de patentes. Porém, do outro lado, há a pressão das farmacêuticas na liderança das vacinas, as quais, obviamente, querem ter seus lucros garantidos.
Em notícia publicada no site da Central Única dos Trabalhadores (CUT), a secretária de Saúde do Trabalhador da entidade, Madalena Margarida Silva disse que a quebra de patentes “é urgente”.
Na opinião dela, “não é tolerável que a indústria farmacêutica tenha lucros bilionários com a produção de vacinas enquanto milhões de pessoas, nos países mais pobres, agonizam à espera da vacina, já que os países mais ricos têm prioridade na aquisição de imunizantes”.
Isso aconteceu nos Estados Unidos, por exemplo. Mesmo sendo negacionista, o ex-presidente Donald Trump adquiriu vacinas da Pfizer para imunizar a população.
No Brasil
Como já dito, o governo brasileiro tem ido na contramão de sua própria história e se posicionado contrariamente à quebra de patentes, em uma postura clara de defesa dos lucros das farmacêuticas em detrimento da saúde e da vida da população.
A médica Marcela Pontes, da Frente da Saúde pela Vacinação Pública, explicou que os brasileiros devem pressionar a Câmara para que vote o Projeto de Lei nº 12/2021, do senador Paulo Paim (PT-RS), já aprovado no Senado, que autoriza o poder executivo a determinar o licenciamento compulsório de patentes de vacinas contra a Covid-19. Ela salientou que a pressão é importante porque o Congresso pode não aprová-la e, se aprovarem, o governo federal pode vetá-la.
“É preciso construir uma campanha em favor da quebra, nacional e internacionalmente, pois há países desenvolvidos (G-7) que se posicionaram contrários à proposta no começo, mas agora, com a postura de Biden, podem mudar de ideia", disse.
A posição do Brasil, segundo a médica, "é péssima", e está ligada a acordos celebrados entre o governo brasileiro e Trump, de apoiar a indústria farmacêutica americana.
Marcela continuou: “O Brasil é o único país em desenvolvimento contrário à quebra de patentes, e isso é um absurdo, porque não faz parte da nossa tradição se opor a esse tipo de questão humanitária!”.
O fato é que a falta de vacinas escancara as desigualdades entre os países. Como sempre, as nações mais pobres ficam no fim da fila e a pandemia fica cada vez mais distante de seu fim.