Artigo
Desde o princípio da pandemia, o governo do estado de São Paulo se diz favorável à Ciência, mas a população vem testemunhando vários de seus deslizes ao longo da crise. Pressionado pelo empresariado para a reabertura da economia, ele vem cedendo. E, recentemente, cedeu novamente ao anunciar o que se convencionou chamar de “fase verde” a partir de junho.
Grosso modo, isso significa o seguinte: o sarrafo do afrouxamento está baixando cada vez mais em um momento em que a situação não está confortável. Não há doses de vacina suficientes para toda a população, houve atrasos no envio de insumos para a produção dos imunizantes porque o governo brasileiro decidiu se indispor com a China, temos em curso uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a ingerência da União no trato da pandemia e, por meio dela, ficamos sabendo que, sim, houve recusas para comprar a vacina da Pfizer.
Mas, voltando a São Paulo, a atitude do governo do estado tem sido bastante criticada por cientistas, ou seja, autoridades que sabem do que estão falando.
Alto índice de mortes
Uma prova de que a situação no estado não está confortável é que cidades do interior anunciaram novas medidas de isolamento e distanciamento físico devido ao aumento do número de casos e mortes. Franca, Bebedouro e Batatais decidiram fechar o comércio e serviços. Também decretarem toque de recolher para evitar o espalhamento do vírus.
Nessas cidades, os hospitais estão lotados e há pacientes na fila de espera da Unidade de Terapia Intensiva (UTI), o que demonstra que não há razão para o otimismo demonstrado pelo governo do estado quando anunciou o afrouxamento das regras, deixando por conta da população a responsabilidade de reduzir o ritmo do contágio.
Em reportagem publicada no jornal “Valor Econômico”, a epidemiologista Gerusa Figueiredo, que é professora do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP e integrante do grupo Ação Covid-19, disse achar “temerário dizer que os números estão se estabilizando, porque estão em patamar muito alto. Não se pode naturalizar esse nível de mortes”.
Ela ainda frisou que as “ondas” de baixa de Covid-19, somada ao relaxamento das restrições, dão a falsa impressão de que a situação está melhor, quando sabemos que não está, e acrescentou: “É muito ruim se fiar em diminuições momentâneas”.
Na mesma linha, Hélio Bacha, consultor técnico da Sociedade Brasileira de Infectologia, disse: “Não tenho problema com o relaxamento do isolamento, desde que haja condições reais para isso. O que vemos hoje é apenas uma vontade de voltar ao normal”.
Em suma, o nosso desejo de uma voltar à normalidade é uma coisa. Mas a realidade nos lembra que a situação é mais cruel do que parece.
Dados
Dados do Consórcio Nacional de Secretários de Saúde (Conass) mostram que a média móvel de sete dias de casos notificados subiu 11%, de 11.719 para 13.025, no estado, entre os dias 12 e 19 de maio. A de mortes caiu ligeiramente, de 521 para 499. As UTIs do estado beiram 80% de ocupação, proporção que tem se mantido estável nas últimas semanas.
Além disso, apenas 20% da população do estado de São Paulo foi vacinada com a primeira dose e a Ciência sabe que apenas com a segunda dose é que a imunização está, de fato, garantida.
Se o Brasil tivesse aceitado as ofertas de vacina em vez de ficar propagandeando o uso de medicamentos comprovadamente ineficazes para a Covid-19, muito provavelmente o nosso desejo de normalidade poderia estar mais palpável agora. Mas, como dito, não é o nosso caso, infelizmente.
Estamos, sim, cansados, mas afrouxar as regras na iminência de uma possível terceira onda é suicídio coletivo patrocinado por quem deveria cuidar de nós.
O SindSaúde-SP defende vacinação para todos os brasileiros e é por isso que nos mobilizamos.