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As trabalhadoras equivaliam a 70% da força de trabalho na área da saúde em 2023, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). No estado de São Paulo, a proporção é semelhante, com 68,85% do setor composto por mulheres, conforme levantamento do Observatório de Recursos Humanos da Secretaria Estadual de Saúde (SES), de junho de 2023.
Esse perfil, porém, demanda reflexões. A primeira delas é tentar compreender porque a área atrai tantas mulheres e uma das conclusões possíveis é que sobre nós ainda recai a tarefa de cuidar, muitas vezes, realizada em duplas jornadas e sem apoio de outros membros da família.
Não bastasse isso, sendo inerente a responsabilidade de tomar conta do outro, os impactos que isso causa são observados como parte da função e negligenciados como fatores causadores de doenças e fonte de dor que precisa ser modificada e não vista como algo natural.
Em março do ano passado, o Observatório da SES também ressaltou que entre 2021 e setembro de 2023, as mulheres foram as que tiveram o maior número de licenças médicas concedidas, com 53.326 casos. Naturalmente, se são maioria no setor, também seriam as principais solicitantes de afastamento. Porém, chama atenção a razão desses pedidos.
Lideram os motivos, transtornos mentais e comportamentais seguidos por doenças do osteomuscular e do tecido conjuntivo, com 17.586 e 11.695 situações, respectivamente. Ambas questões diretamente ligadas a atividades exaustivas de trabalho, que seguem ignoradas como doenças ocupacionais.
A falta de comprometimento dos sucessivos governos e agora também da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) foi fundamental para chegarmos a um quadro de adoecimento que certamente não considera a realidade de muitas que sequer chegam a ser identificadas.
Baixos salários, dimensionamento de pessoal inadequado, assédio organizacional, agressões físicas, verbais, para além dos plantões extras são todas formas de violência que minam a saúde das trabalhadoras. Junto a isso muitas são mães-solo e não contam com apoio do pai de seus filhos para enfrentar essa realidade e diante de uma rotina estafante, torna-se impossível manter a saúde mental.
Chega a ser espantoso que na publicação em que a secretaria identifica as causas de afastamento, recomende às trabalhadoras combater o sedentarismo.
O ciclo é amedrontador: as mulheres sobrecarregadas e exaustas por trabalharem demais e que podem cometer erros por conta da falta de atenção, algo natural de quem vive uma realidade assim, convivem com o medo de responderem processos administrativos e perderem o emprego por receio de falharem.
O SindSaúde-SP segue a lutar para mudar esse cenário e a cobrar medidas como o direito à implementação de Comissões de Saúde do Trabalhador (COMSATs) e Comissões Internas de Prevenção a Acidentes (CIPAs) em todos os locais de trabalho, e a liberdade de atuação dessas comissões, fundamentais para promover a saúde das trabalhadoras, além do reconhecimento da lista de doenças relacionadas ao trabalho.