Artigo
Dentre as muitas perguntas óbvias que devemos fazer aos governos do PSDB, que iniciaram a terceirização e a privatização de unidades de saúde no país, e a atual gestão é: Qual a justificativa para, com recursos disponíveis, não investir no setor?
Para responder, começo por um resgate histórico fundamental da epidemia que toma conta de São Paulo. O fim da Superintendência de Controle de Endemias (Sucen), a falta de investimento em ciência e o descompromisso do governo com o controle de endemias refletiu no número assustador de casos de dengue em 2024. São 922.139 confirmados, destes, 10.468 com sinal de alarme e 1.092 graves, de acordo com os dados divulgados pela própria Secretaria de Estado da Saúde no último domingo (5). Até o momento foram 587 mortes e outras 719 estão sob investigação.
Esse é o maior número de contaminações da história do estado de São Paulo desde o ano de 2000, quando o Ministério da Saúde passou a sistematizar as informações de todo o país em relação à dengue.
Porém, ainda estamos no início de maio e, com a onda de calor que estamos enfrentando, a tendência é que a situação piore, pois não há ações efetivas para o combate ao mosquito por parte do governo do estado, que impôs essa preocupação aos municípios, que por sua vez não têm expertise para tratar da situação e contratam empresas privadas para fazer o serviço que era papel do poder público.
Nesse cenário, os prontos-socorros, as unidades de pronto atendimento e os postos de saúde estão abarrotados. No meio dessa crise o governo do estado, que deveria investir ainda mais em saúde qualificada e com desenvolvimento de pesquisa, como fazia a Sucen, vai na contramão e propõe a entrega de grandes hospitais, sendo dois de regiões periféricas, o Hospital Geral de Taipas e o de Vila Penteado.
Mas, se não bastasse isso, a atual gestão também entrega à iniciativa privada setores do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, referência em doenças infectocontagiosas, e a Urgência e a Emergência do Hospital Infantil Cândido Fontoura, na zona leste da capital.
O repasse dessas unidades ocorre para organizações sociais de saúde (OSS), que ainda deixam os profissionais da saúde estadual do interior atônitos com medo de perder seus postos de trabalho a cada “visita” que fazem, como aconteceu recentemente no Centro de Atenção Integral à Saúde (Cais) Santa Rita e Hospital Estadual de Presidente Prudente.
Importante destacar que esse movimento acontece porque o governo atual alega que não tem dinheiro, que está fazendo “contingenciamento”. Mas se isso é verdade, como há recursos para serem repassados às entidades que irão gerir esses importantes equipamentos?
A resposta para essa pergunta e para o questionamento do primeiro parágrafo inevitavelmente vem acompanhada de outras que os profissionais da saúde fazem diariamente.
Será que o dinheiro que poderia ser investido no combate à dengue e na abertura de concurso será destinado às empresas privadas porque financiam campanhas políticas que podem ser cruciais na eleição de prefeitos este ano?
Será que o objetivo principal é eleger candidatos que apoiam o avanço das privatizações e das terceirizações do serviço público num ciclo pernicioso principalmente para a população mais pobre?
Será que não há denúncias sobre corrupção, superfaturamento e falta de transparência suficientes para justificar uma investigação séria da Assembleia Legislativa de São Paulo, que em 2018 encerrou uma CPI sem nenhuma medida efetiva que mudasse o modelo?
Tantas questões só poderiam ser respondidas caso os parlamentares da base governamental assumissem o compromisso com o povo paulista e efetivamente colocassem em prática o que é garantido pelo SUS, a participação social. Sem isso, mais do que nunca, o trabalho do SindSaúde-SP e dos movimentos sociais comprometidos com a democracia continua e vamos mobilizar a classe trabalhadora e a população para impedir que mais entregas do patrimônio construído e bancado por nós vá para as mãos de quem só visa o lucro.
Caso contrário, estamos sob o risco de construirmos um sistema em que as unidades de saúde estejam sempre de portas fechadas para quem mais precisa.
*Hélcio Marcelino é vice-presidente do SindSaúde-SP e secretário de Organização Sindical da CUT-SP