Supremo tira da Câmara projeto que elimina privilégios de juízes
Autor: FAUSTO MACEDO - O ESTADO DE S. PAULO
09/10/2003
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O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu retirar da Câmara o projeto de lei 144/92, que dispõe sobre o estatuto da magistratura nacional.
A medida, tomada em sessão administrativa da Corte, surpreendeu o governo e sua base aliada no Congresso que pretendiam eliminar antigos privilégios dos juízes, como férias de 60 dias por ano.
Os debates sobre a futura lei orgânica dos magistrados, estabelecendo direitos e obrigações da categoria, estavam bastante avançados. O texto deveria ser votado até novembro como substitutivo ao projeto 144. O Supremo alega que pediu o projeto de volta "para fins de atualização". A assessoria do ministro Maurício Corrêa, presidente do STF, destacou que a proposta foi enviada à Câmara há 11 anos, mas nunca foi sequer examinada.
"Foi um golpe pesado", definiu o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP), presidente da Comissão Especial de Estudo sobre a Reforma do Judiciário.
Convencido de que o projeto poderá permanecer retido no STF por tempo indeterminado, Cardozo conseguiu aprovar ontem à tarde uma forma de neutralizar a ação dos magistrados. A proposta do parlamentar é transformar em emenda à Carta os pontos que tenham "natureza constitucional".
Além de estabelecer férias de 30 dias ao ano, a comissão sugeriu imposições de grande impacto nos tribunais, como a quarentena de entrada - o escolhido para cargo de magistrado em tribunal superior não pode ter ocupado, nos cinco anos anteriores, cargo de confiança. Também havia consenso para fixar quarentena de saída, proibindo ao magistrado que se aposenta de exercer advocacia pelo prazo de cinco anos.
Outras propostas incomodam a toga. Uma delas impede que familiares de magistrados exerçam a advocacia em tribunais ou fóruns em que estes estejam atuando. O orçamento participativo no Judiciário - todos os juízes de primeira e segunda instâncias podem participar da elaboração da proposta orçamentária -, a vinculação orçamentária de gastos com a estrutura, a modernização da primeira instância e a eleição dos cargos de direção dos tribunais por todos os magistrados também provocam polêmica entre ministros e desembargadores.
"Recebi com surpresa muito grande o gesto do Supremo", declarou o deputado Luiz Carlos Santos (PFL-SP), que requereu a convocação do presidente do STF para comparecer à comissão. "Ele poderá dizer o que acha, se precisa de reforma e em que nível", argumentou Santos.
Maioria - A atribuição de propor alterações na lei orgânica dos juízes é privativa do STF, conforme o artigo 93 da Constituição. A lei em vigor é do regime militar. Foi aprovada em 1979. Em 1992, o STF enviou ao Congresso o projeto 144 com as modificações que considerava necessárias. Há duas semanas, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), mais influente entidade da classe, sugeriu ao STF que retirasse o projeto. "Do ponto de vista racional, político e lógico é preciso aguardar que primeiro seja votada a reforma do Judiciário para, depois, cuidar da lei orgânica, que é complementar à Constituição", advertiu o presidente da AMB, desembargador Cláudio Baldino Cadico Maciel.
Cadico lembrou que a própria entidade enviou sugestões à Câmara e ponderou aos deputados a necessidade de devolução do projeto ao STF para uma atualização. "O 144 foi preparado numa época em que ainda havia juízes classistas, o Judiciário mudou muito, aquele projeto não representa mais o ideal para o Judiciário e para a sociedade." O presidente da AMB disse que a categoria "não está preocupada e não vai fazer cavalo de batalha" com a questão das férias de 30 dias. "Isso é insignificante."
A presidência do Supremo informou que a retirada foi decidida, por maioria, na sessão administrativa de 2 de outubro "para fins de atualização" do texto. "O projeto tem que ser revisto com tranqüilidade porque está completamente defasado", observou a assessoria de Corrêa. "Nesse período, foram feitas mais de 40 emendas à Constituição, o Supremo vai atualizar a proposta e devolvê-la rapidamente."
O deputado Ibrahin Abi Ackel (PP-MG), relator-geral da comissão, considera que "o Supremo tem toda a razão". Para ele, "é natural que o STF queira alterar um projeto que enviou ao Congresso há tanto tempo."
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