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São Paulo – A proposta de extinguir a tarifa mínima da conta de água e cobrar por litro consumido, apresentada ontem (4) pelo presidente da Sabesp, Jerson Kelman, sob justificativa de reestruturação da tarifa, é exemplo do “pensamento privatista que vem conduzindo a companhia”, na avaliação de Carlos Thadeu de Oliveira, gerente técnico do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). Para ele, a mudança não tem o objetivo de ampliar a economia de água, mas de faturar mais dinheiro. “Sempre que pensam em reestruturação, eles defendem que se cobre mais. O negócio deles é arrecadar mais”, afirmou.
Hoje, quem consome até 10 mil litros de água paga R$ 20,64 (mais o mesmo valor pelo esgoto produzido, totalizando R$ 41,28). Quem consome entre 11 e 20 mil litros, paga R$ 3,23 por milhar. De 21 a 50 mil litros, R$ 8,07. Acima de 50 mil litros, R$ 8,89. Para famílias de baixíssima renda, existe a tarifa social de R$ 14 – considerando as duas cobranças.
A proposta da Sabesp é cobrar uma tarifa básica pelo serviço, mais o valor de cada litro de água consumido. Para Kelman, o modelo atual não incentiva a economia de água. “Dizer que, até 10 mil litros, a conta de água tem o mesmo valor é um contrassenso. Historicamente, 10 mil litros de consumo era razoável para uma família durante o mês. No entanto, com a diminuição do tamanho das famílias brasileiras, essa meta começa a ficar folgada”, argumentou o presidente da Sabesp, que espera apresentar uma proposta à agência reguladora nos próximos meses.
O diretor do Idec avaliou que, sendo adotado um valor único para o litro de água consumido, quem hoje consome mais vai pagar menos, porque é pouco provável que a Sabesp estabeleça como valor geral o valor mais alto cobrado hoje. “A Sabesp deveria repensar a tarifa com uma progressividade mais forte. Nesse caso está sendo regressivo, vai penalizar quem hoje consome menos”, afirmou Oliveira.
Essa é a mais nova tentativa da Sabesp de superar a crise financeira em que a companhia alega se encontrar desde que foi deflagrada a crise hídrica em São Paulo, no ano passado. Entre as medidas tomadas estão dois reajustes na tarifa, um de 6,49% aplicado em novembro de 2014 – autorizado desde abril, mas suspenso devido à eleição – e outro de 15,24%, aplicado em junho deste ano. Além disso, a Sabesp quer repassar aos consumidores o custo dos 7,5% da receita bruta arrecadada, que é obrigada a destinar ao Fundo Municipal de Saneamento Ambiental e Infraestrutura para execução de obras.
O gerente do Idec ressaltou, no entanto, que não discorda de repensar a tarifa mínima, pois hoje quem consome 6 mil litros de água paga por 10 mil e o modelo, efetivamente, estimula que se consuma mais. “Mas, se a preocupação é reduzir o consumo, a companhia poderia isentar de tarifa quem consome até 5 mil litros de água por mês e aplicar tarifas mais altas, quanto maior for o consumo”, defendeu.
Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), o ideal para uma pessoa satisfazer suas necessidades diárias, sem desperdício, é de 110 litros por dia. Considerando uma casa com três pessoas, atual média familiar segundo o IBGE, o consumo ideal seria de 9,9 mil litros de água por mês. Então, há pouco espaço para reduzir entre quem já não consome muito.
“Eles têm os elementos para fazer uma medida racional e justa, que leve à economia de água. Eles têm todo o perfil de consumo de água. Eles estão fazendo isso com base em números, pensando em quanto vão ganhar a mais”, afirmou Oliveira.
Oliveira lembrou que tanto o presidente da Sabesp quanto o secretário de Saneamento e Recursos Hídricos, Benedito Braga, são defensores da ideia de que a água é um bem econômico e da atuação de empresas privadas no setor de saneamento. “Eles pensam no sentido inverso nosso. Estão do lado dos que defendem a privatização da água”, afirmou.
Braga foi presidente do Conselho Mundial da Água até tomar posse como secretário. A organização foi criada em 1997 e defende o ingresso do capital privado no setor. O conselho é mantido por cerca de 300 organizações de 70 países, tendo entre seus membros algumas das maiores empresas privadas de água do mundo, como as francesas Suez e Vivendi, que controlam cerca de 70% do mercado mundial.