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“A lentidão do processo de vacinação é uma face desse extermínio, é mais um elemento desse extermínio, desse genocídio que está em curso no Brasil. A pandemia se tornou numa crise sanitária de extermínio da classe trabalhadora brasileira, de parte importante da classe trabalhadora brasileira”, aponta a professora Sara Granemann, da Faculdade de Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Ela participou no último sábado (24) de debate organizado pela Frente da Saúde pela Vacinação Pública, com apoio do TUTAMÉIA, que teve como centro da discussão a tentativa do governo de privatizar a compra e a distribuição de vacinas contra a covid 19. Também participaram os ex-ministros da Saúde Alexandre Padilha e Arthur Chioro, mais o médico Boris Vargaftig, que representou a Frente na mesa redonda virtual.
Concordando com Granemann, o professor Chioro afirma: “Nós estamos pagando um preço altíssimo pela criminosa decisão do governo Bolsonaro de expor de maneira irresponsável a população brasileira, ainda que soubesse que morreria muita gente, porque não tem nenhum compromisso com isso”.
Acompanhe a seguir trechos das participações dos debatedores:
SARA GRANEMANN: DEBATE POR VACINAÇÃO DEVE IR DE MÃOS DADAS COM A LUTA PELO IMPEACHMENT
A lentidão do processo de vacinação é uma face desse extermínio, é mais um elemento desse extermínio, desse genocídio que está em curso no Brasil. Isso é também parte do controle, é uma medida de contenção para a organização da classe trabalhadora. Há que dar um basta!
A vacinação não se resolverá só pela discussão da vacinação. Esse debate sobre o que mais é preciso junto com a vacinação –o debate do impeachment. Sem a luta por impeachment, a vacina não se resolverá de outro modo, a não ser com essa lentidão, que vai ainda potencializar muito mais o extermínio.
Essas duas medidas andam de mão dadas, têm de ser evidentemente postas num debate numa grande articulação de todos aqueles que não queremos mais a próxima morte. Impeachment e luta pela vacinação rápida, ágil e não só para nichos da população brasileira
Entender que a pandemia se tornou numa crise sanitária de extermínio da classe trabalhadora brasileira, de parte importante da classe trabalhadora brasileira, é móvel para nossa campanha pela vacinação pública e é móvel para nossa necessária luta pelo impedimento de Bolsonaro, que é um genocida.
ARTHUR CHIORO: TESE DE BOLSONARO MOSTRA DESCASO COM A VIDA
Há uma tese que vem sendo perseguida pelo governo Bolsonaro, que é um descompromisso, um descaso com a vida, que colocou em prática a ideia de que quanto mais rápido a maior parte da população fosse submetida à exposição ao vírus, ainda que a mortandade, o genocídio fosse do tamanho que está sendo, se alcançaria a imunidade de rebanho. Nós pagamos um preço altíssimo pela criminosa decisão do governo Bolsonaro de expor, de maneira irresponsável a população brasileira, ainda que soubesse que morreria muita gente, porque não tem nenhum compromisso com isso.
É claro que há uma lógica econômica por trás disso, tem o dedo não apenas da lógica do regime fiscal, a ideia de que não se deve fazer gasto público. Há também uma modelagem técnica, produzida na gestão do ministro Mandetta, que ajudava a explicar isso: havia uma previsão do governo de que em setembro/outubro do ano passado a epidemia acabaria. Isso fez com que o governo Bolsonaro investisse em uma única vacina. Um erro crasso.
ALEXANDRE PADILHA: É PRECISO REPENSAR OS MECANISMOS DE GOVERNANÇA GLOBAL DA SAÚDE
A pandemia é um fenômeno global. A gente não consegue superá-la de forma isolada. O Brasil não vai dar conta de acelerar seu plano de vacinação, enfrentar o que nós precisamos enfrentar, sem pensar em formas de articulação internacional.
Há três aspectos da resposta global que são fundamentais. Primeiro: a centralidade da necessidade de sistemas de saúde públicos universais de saúde. Ou o mundo sai dessa pandemia com um pacto político, um novo ciclo de lutas populares, para que a gente volte a ter a saúde como um direito, com o fortalecimento de sistemas nacionais universais públicos de saúde onde existiram e construção onde eles não existem, ou nós teremos nos próximos anos outras pandemias com tanta força e tanto impacto como a covid 19.
Vai exigir da gente, no Brasil, para superar a pandemia e os seus efeitos sanitários, que vão durar os próximos dois, três, quatro, cinco anos, um novo ciclo de reconstrução do SUS, de resgate do SUS, que vai exigir da gente construir um novo movimento de reforma sanitária, com capacidade de articulação ainda mais ampla.
O segundo tema é o acesso às novas tecnologias, às vacinas. A questão não é nem a quebra de patentes, mas sim quebrar o monopólio de quem é dono das patentes. Não pode ele decidir sozinho quem pode produzir, quem pode comercializar, como pode distribuir, essa é uma questão decisiva para o mundo hoje.
E o terceiro ponto é que nós precisamos repensar os mecanismos de governança global da saúde. A Organização Mundial da Saúde tentou um mecanismo para acelerar a produção e o acesso dos países às vacinas, o Covax Facility. Mas é insuficiente para coordenar o conjunto das ações para a saúde global, como será insuficiente qualquer mecanismo que a OMS venha a propor. Ou a saúde passa a ser assumida como tema central dos chefes de governo, dos chefes de estado, ou nós vamos ter articulações insuficientes para enfrentar tanto a atual pandemia, por que não estão superados os impactos dela, econômicos e sociais e na saúde, como os outros problemas que vão surgir.
BORIS VARGAFTIG: SEM CONTROLE POPULAR, A COISA VAI MAL
A privatização é a essência da burguesia; burguesia é igual a privatização. É uma coisa normal que os burgueses procurem monopolizar tudo. Conseguem, dominando a ideologia que domina na sociedade, que as pessoas em geral considerem que a sociedade tem de se organizar de uma forma privatista.
A grande ideia hoje é transformar o Brasil num grande Portugal do passado: fazer o que foi o salazarismo, ou seja, desindustrializar e manter o agronegócio, e dar uma esperança aos pobres que é a da religião da prosperidade.
A ideia da privatização é errada. É o SUS que deve fazer o atendimento. O grande perigo da não estatização imediata é o subterfugio nos acordos, acordos que tenham coisas escondidas.
Precisamos de um acordo que permita que a vacina seja muito rapidamente estendida para todoa a população do país.
A distribuição tem de ser pelo SUS. Não podemos permitir, por exemplo, que após qualquer acordo, que os vendedores venham a fazer preços diferentes. Vejam, por exemplo, a disparidade dos preços dos testes. Toda a tentativa atual de acordo [com fabricantes] ou de quebra de patentes devem ter um controle popular. Se não tiver controle popular, a coisa vai mal. Os preços vão variar, a distribuição vai variar, vai ter gente mais rica que vai ter tratamento antes e assim por diante. Portanto: controle popular, controle estatal e impedimento da distribuição e da venda pelo privado, tudo deve ser estatizado.
FRENTE DA SAÚDE CONCLAMA: VAMOS FAZER REUNIÕES VIRTUAIS NOS BAIRROS
Ao longo do debate, muitas pessoas que acompanhavam a discussão perguntavam o que deve ser feito, o que eles próprias poderiam fazer, como contribuir.
Marcela Pontes, da Frente da Saúde pela Vacinação Pública, informou que o movimento está aberto para debater com quaisquer interessados, disposto a participar, por exemplo, de reuniões virtuais com entidades, grupos de bairro ou outras associações.
A Frente, que é uma construção militante de trabalhadores da saúde que tem por objetivo alcançar uma cobertura vacinal contra a covid 19 em todo o território nacional, também produz folhetos, cartazes e materiais para debater a questão.
Texto produzido por Eleonora de Lucena e Rodolfo Lucena, do www.tutameia.jor.br