Sindicato unido e forte
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    SUS não é mercadoria
    Autor: Revista Radis
    02/06/2015

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    Frente nacional contra a privatização defende retomada dos princípios da Reforma Sanitária e garantia de acesso universal
    Quanto você pode pagar pela saúde?” em oposição a essa tendência que transforma um direito em mercadoria, a Frente Nacional contra a Privatização da Saúde alerta para a adoção cada vez mais frequente de medidas que favorecem o mercado privado e ameaçam o SUS verdadeiramente público e de todos. Entre as pautas colocadas pelos movimentos sociais, pesquisadores e estudantes, reunidos no 5º seminário organizado pela frente — entre os dias 27 e 29 de março, no Rio de Janeiro —, está a defesa da saúde como um direito de todos e dever do Estado, só garantida por serviços de caráter público e universal e por efetivo controle social democrático.
     
    O grito de alerta que ressoou no encontro reage contra processos de mercantilização e desmonte do Sistema Único de Saúde (SUS), que incluem as desonerações e renúncias fiscais (Radis 150), a entrada de capital estrangeiro no setor (Radis 151) e a ameaça aos direitos dos trabalhadores representada pelo avanço da precarização e terceirização da mão de obra. Com o intuito de recuperar os princípios orientadores da Reforma Sanitária dos anos 1980, que levaram à criação do SUS, a frente reúne 21 comitês estaduais e agrega diferentes movimentos — frentes sindicais, de luta pela moradia, pela reforma agrária, pelos direitos dos povos indígenas, de estudantes, entre outros — sob a mesma bandeira de defesa da saúde pública. 
     
    Tais movimentos sociais foram fundamentais no processo de redemocratização da sociedade brasileira, ressalta Maria Inês Bravo, professora da Escola de Serviço Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) e uma das principais lideranças da frente. “Para que possamos construir uma sociedade diferente, é preciso defender um projeto realmente emancipatório, de enfrentamento do capitalismo”, destacou. Segundo a pesquisadora, a partir dos anos 1990, a saúde pública brasileira passou por um processo de contrarreforma, com o chamado desfinanciamento (diminuição dos recursos públicos destinados ao setor) e a piora nas condições de trabalho para os profissionais. A razão dessas mudanças, ela ressalta, foi o avanço das políticas de privatização e de desmonte dos direitos sociais, dentre eles a saúde.
     
    Mudar a sociedade
    Garantir a saúde é melhorar as condições de vida de um povo, aponta o cubano Jesus Garcia Brigos, professor do Instituto de Filosofia de Cuba e um dos representantes das experiências da América Latina no encontro. Mais do que políticas de redistribuição de renda, o pesquisador defende a necessidade de ações do Estado que incentivem o desenvolvimento pleno e livre de toda a sociedade em seu conjunto. Ao levar em conta os determinantes sociais sobre a saúde, ele relata que a experiência cubana desenvolveu um sistema de saúde integral, que vai do tecnológico ao social, já que os resultados da pesquisa científica estão voltados para a melhoria das condições de vida da população.
     
    Como alertam diferentes especialistas, a tendência mais frequente é a de enxergar a saúde como uma mera moeda para se obter lucro. Para Hermano Castro, diretor da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (Ensp/Fiocruz), os interesses privados ameaçam as conquistas sociais do SUS. “O capital privado pensa a saúde como mercadoria, com lucro exorbitante para alguns e direitos reduzidos para todos”, aponta, ao citar o caso recente de aprovação da lei 13.097, que autoriza a entrada de capital estrangeiro em todas as atividades do setor (Radis 151).
     
    “A saúde para a classe trabalhadora é um bem. Mas para o capitalismo é simplesmente um nicho de mercado”, aponta a pesquisadora da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), Marcela Pronko. Para ela, os interesses mercadológicos estão presentes desde a formação de profissionais até a oferta de serviços. A pesquisadora aponta ainda que é preciso avaliar a atuação do Estado nesse processo, pois ele também pode promover ou reforçar desigualdades. “A saúde é um bem de todos e um dever do Estado. Mas que Estado e com qual caráter público?”, questiona. Ela também destaca que não basta uma mudança na distribuição de riquezas para superar as desigualdades do capitalismo. É preciso, segundo ela, outra forma de pensar a sociedade.
     
    Precarização do trabalho
    O próprio Estado é responsável pela precarização do trabalho e pelo desrespeito aos direitos dos trabalhadores, aponta Raquel Varella, professora da Universidade Nova de Lisboa. Segundo ela, ao estimular vínculos empregatícios com baixa remuneração e sem garantia de direitos, o poder público favorece os interesses privados. Isso se dá pelo incentivo à terceirização da mão de obra, como acontece com o recente projeto de lei sobre o tema (PL 4.330), aprovado em abril na Câmara dos Deputados (Radis 152).
     
    Para a pesquisadora, a mercantilização no setor da saúde é ampliada pela questão tecnológica. “Há uma tendência em substituir o trabalho do profissional de saúde pelo uso de recursos técnicos, sem haver um cálculo racional sobre o custo/benefício da transferência tecnológica”, alerta. De acordo com ela, não se trata de ignorar os meios auxiliares de diagnóstico e os benefícios oferecidos pela tecnologia, mas é essencial avaliar se essa mudança passa a ser mais importante que a valorização do profissional. Segundo ela, uma tendência que acompanha esse processo é a redução das equipes e a sobrecarga de alguns profissionais, principalmente os menos remunerados, como da área de enfermagem. “Ainda assim, os profissionais optam por garantir a saúde, mesmo com as condições adversas”, ressalta.
     
    Retomar a Reforma Sanitária
    O documento-base do encontro aponta que é preciso retomar as propostas da Reforma Sanitária que preconizavam a ampliação de investimentos públicos na saúde e a garantia de acesso universal, com qualidade, para toda a população. Ainda segundo o texto, essa “retomada” deve se dar em oposição a um projeto de reforma “flexibilizada”, que abre mão das conquistas que estão na Constituição de 1988, ou privatista, que permite o avanço dos interesses de mercado sobre a saúde. “A verdadeira Reforma Sanitária propõe um projeto civilizatório por meio da articulação entre saúde, democracia e socialismo”, defende Maria Inês Bravo. 
     
    A defesa da saúde pública de qualidade perpassa outras reivindicações — por moradia, terra e trabalho digno — e exige um olhar que integre as diferentes lutas sociais. Para Sonia Guajajara, integrante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), defender o direito desses grupos é também uma reação contra a entrada das grandes mineradoras, hidrelétricas e rodovias em suas terras. “A partir da defesa dos territórios da natureza, nós defendemos o direito à vida de todos os seres humanos”, afirma. Já Kelly Malfort, do Movimento dos Trabalhadores sem Terra (MST), assegura que é preciso construir políticas de saúde articuladas com outro modelo de sociedade. “Nós não conseguiremos enfrentar nenhuma pauta específica dos movimentos sociais se não for através da busca por unidade, que não significa anulação das diferenças, mas integração das diferentes lutas que tem se dar nas ruas”, propõe.









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