“Reforma da Previdência acaba com o Estado social de 1988”, afirma economista
Autor: Brasil de Fato - Cristiane Sampaio
13/05/2019
Crédito Imagem: Brasil de Fato
Em audiência na comissão especial da PEC da Previdência, especialistas compartilharam preocupações com o tema
Em audiência pública sobre a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 6/2019 na Câmara dos Deputados nesta quinta-feira (9), o professor do Instituto de Economia da Universidade de Campinas (Unicamp) Eduardo Fagnani afirmou que a reforma da Previdência, instaurada pela PEC, “acaba com o Estado social de 1988” porque promove a retirada de direitos conquistados no bojo do processo de redemocratização do país.
Ele foi um dos especialistas ouvidos pela comissão especial que analisa a proposta na Casa para debater a matéria nesta quinta. Fagnani criticou a rigidez das normas propostas pela PEC e destacou, entre outras coisas, que a reforma teria o objetivo de acabar com a Seguridade Social, que é “o principal instrumento de proteção social do Brasil”, e que por isso irá ampliar a desigualdade no país.
O professor ressaltou que o INSS atende, por exemplo, cerca de 5 milhões de pessoas que dependem do Benefício de Prestação Continuada (BPC), que tem valor de um salário mínimo e é concedido a pessoas com deficiência e idosos que tenham comprovada falta de condições para se manter ou de serem mantidos por familiares.
Na PEC 6, o governo propõe alterações para o segundo grupo, que hoje tem idade mínima de 65 anos para requerer o benefício e passaria a ter direito ao valor de um salário mínimo somente a partir de 70 anos. A reforma propõe que, a partir dos 60 anos, o idoso possa receber um valor de R$ 400 ao mês. Esse é um dos aspectos mais polêmicos da reforma e tem sido alvo de críticas inclusive por parte de membros de partidos da direita liberal.
“O país vai sair da Seguridade Social para o assistencialismo”, assinalou Fagnani, destacando essa e as demais exigências da PEC. O professor também criticou o sistema de capitalização trazido pela reforma e disse que as regras da PEC “são muito exigentes e desconsideram por completo a realidade do mercado de trabalho brasileiro”.
Para embasar a afirmação, ele citou o panorama do desemprego nacional – que atingiu a marca de 13,4 milhões de pessoas em abril, segundo dados oficiais do IBGE – e lembrou a precarização das relações de trabalho, endossada pela reforma trabalhista. Fagnani destacou ainda o alto índice de informalidade, que faz com que muitos trabalhadores não tenham carteira assinada e, por isso, não possam contribuir para a Previdência.
O ex-banqueiro Eduardo Moreira, formado em Economia pela Universidade da Califórnia de San Diego (USCD), também fez críticas à reforma. Ele chamou a atenção para o fato de a PEC não ser igualitária naquilo que se refere à rigidez das normas. Moreira também disse que o debate público carece de maior nível de informação e detalhamento, de forma a popularizar os contrapontos ao discurso oficial do governo.
“A população está com uma ideia errada de que está se tirando dos riscos pra dar pros pobres. E essa reforma não faz a situação de ninguém ficar melhor em termos de tempo pra se aposentar e do quanto vai receber depois do que antes. Todos estão pagando mais ou recebendo menos. Tem que jogar com uma transparência enorme e as pessoas têm que entender o que significa a PEC 6”, disse.
Sistema tributário
Moreira aproveitou a oportunidade para defender ainda uma distribuição mais igualitária da tributação no país. O argumento tem sido também um dos principais aspectos apontados por deputados de oposição como medida para a economia nacional.
Em audiência na comissão especial da PEC na quarta-feira (8), ao afirmar que a reforma seria importante para destravar a economia, o ministro Paulo Guedes foi questionado por deputados a esse respeito. Na ocasião, ele disse que o governo pretende fazer uma reforma tributária, mas somente mais adiante porque a PEC 6 seria mais urgente.
Nesta quinta, Eduardo Moreira disse aos deputados que o sistema tributário do país é uma “máquina de desigualdades”.
“Numa comparação do Brasil com os países da ODCE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico], nós somos o segundo que mais paga impostos sobre bens e serviços e somos o que menos paga impostos sobre renda e ganho de capital. E aí, o que acontece? O pobre gasta tudo que ganha. Então, a incidência dos impostos sobre bens e serviços pega o dinheiro do pobre, leva pro governo como receita tributária, e o governo usa pra quê? Ele usa esse dinheiro pra pagar os juros da dívida pública”, destacou.
A audiência desta quinta foi a segunda de uma série de outros debates que deverão ocorrer sobre a PEC 6 na comissão especial que analisa o texto na Câmara dos Deputados.