O direito de greve no serviço público - recomendável conhecer para legislar
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    O direito de greve no serviço público - recomendável conhecer para legislar
    Autor: Denise Motta Dau
    06/11/2007

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    No último dia 25/10/2007, o Supremo Tribunal Federal (STF) estendeu aos trabalhadores do setor público a aplicação da lei 7.783, de 1989, que regulamenta a greve para o setor privado. Ao “propor uma solução para a omissão legislativa” o Supremo acabou por desconsiderar todo o debate que vêm ocorrendo sobre essa questão que extrapola o próprio tema greve.
    A Constituição de 1988 reconheceu expressamente a greve como direito fundamental para os servidores públicos civis (art.37, incisos VII), nos limites definidos em lei (complementar até 1998 e específica a partir da emenda constitucional 19), sem entretanto, garantir o direito à negociação coletiva. Desse modo a regulamentação do direito de greve sem construir caminhos para que os conflitos sejam negociados na prática, ao invés de fortalecer a construção do Estado Democrático de Direito acaba por reforçar as características autoritárias do Estado pré-1988, que sobrevive em todas as esferas e poderes da República.

    Ao estender a regulamentação do direito de greve do setor privado para a realidade do setor público e sobrepor realidades distintas apoiadas tão somente no termo “no que couber”, o STF deixa para interpretações futuras o que será aplicado ou não da lei 7.783, fato este que gerará novos questionamentos jurídicos e indefinições.

    Além disso, a simples extensão da regulamentação do setor privado não garante os instrumentos necessários à criação de um processo no qual o exercício do direito de greve seja precedido de mecanismos democráticos de resolução de conflitos, em especial, a negociação coletiva.

    A realidade do setor privado não é a mesma que a do setor público. Um exemplo disso é que no setor público, com raras exceções, não há data-base, ou seja, não há um momento definido em que o empregador – no caso o gestor público- se veja obrigado a debater as reivindicações dos trabalhadores.É importante ressaltar que várias experiências de instalação de mesas de negociação no setor público foram consolidadas a partir do final dos anos 80, devido a mobilização dos servidores aliada à vontade política dos gestores justamente com o objetivo de buscar a eficiência e melhoria da qualidade dos serviços prestados à população aliada à democratização das relações de trabalho.
    Além disso, como não há previsão legal no que se refere ao direito a negociação coletiva, não há como obrigar o administrador público a receber e negociar as demandas dos trabalhadores, fato este que leva em muitos casos à deflagração da greve como único e não último instrumento para se debater as necessidades dos trabalhadores.
    No setor público não há a possibilidade do conflito ser mediado e arbitrado, e, em caso de não acordo, a alternativa do dissídio coletivo, figura comum no setor privado, não existe.
    Outro elemento importante reside na suspensão do pagamento dos trabalhadores grevistas. Normalmente, afirma-se que o servidor em greve e recebe sem trabalhar. No entanto, cabe ter claro desde logo que cada paralisação tem regras próprias de compensação dos dias parados ou desconto destes, definidos em cada uma das esferas e poderes.

    Ademais dependendo do setor em que a greve ocorre , faz-se necessária a presença dos grevistas no local de trabalho.No setor saúde por exemplo: é preciso redobrar a atenção durante o movimento grevista visando a manutenção do atendimento de emergência.Sendo assim os grevistas permanecem fazendo a triagem destas demandas, além disso é preciso manter o atendimento aos pacientes já internados (banhos, alimentação, curativos, exames etc.) que não podem ser interrompidos, portanto com ou sem regulamentação do STF esse atendimento já é garantido.Esses fatores devem ser levados em conta na negociação dos dias parados.

    No setor privado, a greve é caracterizada pela suspensão temporária do contrato de trabalho e os dias parados são negociados entre as partes, realidade está não aplicável no setor público, uma vez que este não é regido por contrato, mas sim por um estatuto específico. Cada um dos 25 estados e 5561 municípios da federação define regras próprias em lei quanto à possibilidade de caracterização de dias não trabalhados (seja por greve ou outro motivo) e as regras de desconto ou reposição destes.
    Ainda sobre jornada de trabalho, uma realidade pouco divulgada é a diferenciação entre setor público e privado no que se refere às horas-extras. No setor público, essas horas só são pagas quando definidas e publicadas em instrumento legal próprio, o que na prática faz com que a grande maioria dos servidores nunca receba as horas a mais trabalhadas.
    São essas diferenças (aqui citadas só algumas) que levaram a CUT a tomar várias iniciativas inclusive articuladas internacionalmente – por meio dos subsídios políticos e técnicos da ISP/Internacional dos Serviços Públicos- junto ao poder legislativo sobre a regulamentação do tema mas que ainda não foram aprovadas pelo Congresso Nacional. Essa demanda fez também com que o Governo Federal e as Entidades Sindicais do Setor Público criassem a Câmara Setorial do Serviço Público do Fórum Nacional do Trabalho (FNT), que teve como objetivo o debate sobre as premissas e diretrizes para a regulamentação da negociação coletiva e o direito de greve. Este fórum, tem sua continuidade no Grupo de Trabalho constituído pelo Executivo Federal, conforme portaria no. 1.486 de 31 de julho de 2007 e portaria nº 1953 de 17 de outubro de 2007 do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão,visando regular a matéria para as três esferas de contratação, Municípios, Estados e União.Outra questão importante e que precisa avançar urgente no Brasil é a ratificação da Convenção 151 da OIT que garante o direito de organização sindical e de negociação coletiva para o setor público, aqual nos impulsionaria em avançar para uma legislação própria do país.

    É importante registrar que nas primeiras reuniões que trataram do do tema “direito de greve” ficou acordado entre a bancada sindical e a bancada do governo a seguinte premissa: “A regulamentação do Direito de Greve está diretamente condicionada à Prática da Negociação no Setor Público, ficando certo que em condições de não instalação dos processos negociais não há restrições ou condicionantes ao exercício do Direito de Greve”, posição esta que reafirmamos.

    Enfim, seja no que se refere a recente decisão do STF ou aos debates que ocorrem dentro do Congresso Nacional é importante a aprovação de uma legislação que contemple as especificidades do serviço público, democratize as relações de trabalho com a participação da sociedade e contribua na construção de um Estado Democrático de Direito de fato.

    Denise Motta Dau é Secretária Nacional de Organização da Central Única dos Trabalhadores,Dirigente do Sindsaúde-SP, Assistente Social e Mestra em Saúde Coletiva.









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